Este trabalho faz parte do relatório final de uma Bolsa do
Programa de Capacitação Institucional do INPA/CNPq, no ano de 2000, e foi
desenvolvido pelo Biólogo Luis Henrique Monteiro Gomes, tendo como orientador a
minha pessoa (V. Py-Daniel). Foram usados dados previamente coletados durante
os anos de 1994 e 1995, pela equipe do então Laboratório de Oncocercose, da
então Coordenação de Pesquisas em Entomologia do Instituto Nacional de
Pesquisas da Amazônia (LABONCO-CPEN-INPA). Os dados foram coletados para o
Programa Brasileiro de Eliminação da Oncocercose, dentro do Programa de
Eliminação da Oncocercose para as Américas (OEPA). Entre os dados coletados
para os estudos da oncocercose também foram obtidas informações de infecção
natural dos simulídeos por Mansonella ozzardi (Manson,1897),
o que fez com que fosse inclusa uma bibliografia mais atualizada sobre a mesma.
As informações originais do relatório foram mantidas no máximo possível, no
entanto, alguns textos tiveram que ser refeitos e apropriados, dentro da
necessidade de melhorar o conteúdo para publicação.
OBSERVAÇÕES SOBRE ESPÉCIES DE SIMULÍDEOS VETORAS DE ONCHOCERCA
VOLVULUS (LEUCKART,1893) E MANSONELLA OZZARDI (MANSON, 1897) EM OITO LOCALIDADES DA TERRA
INDÍGENA YANOMAMI/YE´KUANA (1994-1995), BRASIL.
Gomes,L.H.M. 1, Py-Daniel,V.2*,
Andreazze,R.2**, Medeiros,J.F. 2***, Barbosa,U.C.2****,
Silva,O.S.2****, Junior,E.S.L.2*****
Palavras Chaves: Infecção
Natural, Oncocercose, Mansonelose, Simuliidae, Yanomami
1 - Bolsista PCI
(INPA/CNPq); 2 – INPA/CPEN/LABONCO (*Atualmente associado a UNB/ICB/DZ/LEF, **
Atualmente UFRN, Atualmente FIOCRUZ-RO, **** Atualmente INPA/SAS/LETEP, *****Atualmente
INPE/CRH/DGP).
RESUMO
Durante
o levantamento epidemiológico pré-tratamento da transmissão da filaria Onchocerca volvulus (Leuckart, 1893),
desenvolvido em toda a Terra Indígena Yanomami, no Brasil, no período dos anos
de 1994 a 1996, foram coletados imaturos nos criadouros, como também feitos
experimentos de atividade de picada pelas fêmeas dos simulídeos. Foram
selecionadas oito localidades para serem analisadas, neste trabalho específico,
, sendo três no Estado do Amazonas (Ajuricaba, Apuí e Pukina) e cinco no Estado
de Roraima (Waikás, Paapiú, Baixo Mucajaí, Alto Mucajaí-Missão Mucajaí e
Palimiú). O intuito foi determinar a Infecção Natural por Onchocerca volvulus de
três espécies das espécies de simulídeos encontradas [Cerquerellum oyapockense
(Floch & Abonnenc, 1946), Psaroniocompsa incrustata (Lutz,
1910), Thyrsopelma guianense (Wise, 1911), reconhecidamente vetoras de
filarias; e obter a Taxa de Infecção Parasitária (TIP), sendo que também foi
observada a topologia corpórea preferencial para picada e o estado fisiológico
ovariano das fêmeas em atividade hematofágica. No entanto, na localidade Apuí,
no Estado do Amazonas, foi encontrada outra filaria, M. ozzardi, cujos os
resultados também são aqui apresentados. Os resultados mostraram que C.
oyapockense foi a espécie mais abundante, exercendo atividades de
picada do tipo bimodal em todas as áreas, tendendo a exercer maior atividade no
período da tarde. Tanto T. guianense como P.
incrustata apresentaram pequena densidade. T. guianense foi coletada nas
localidades de Alto Mucajai-Missão Mucajaí e Waikás. P. incrustata foi
coletada somente na localidade de Paapiú. As espécies C. oyapockense e T.
guianense apresentaram maior preferência em picar nas partes altas do corpo
(tórax/pescoço), exceto em Pukina, onde C. oyapockense apresentou maior
preferência em picar nas partes baixas do corpo (pernas/pés) tanto quanto a P.
incrustata. Houve predomínio de fêmeas paríparas. Todas as fêmeas com
positividade para O. volvulus e M. ozzardi pertenciam a C.
oyapockense. Foram encontradas larvas de O. volvulus e de M. ozzardi em todos as
fases de desenvolvimento, sendo assim C. oyapockense a principal espécie
vetora, nas amostras, no período e nas localidades estudadas.
INTRODUÇÃO
ONCOCERCOSE
- Oncocercose ou “cegueira-dos-rios” é uma doença parasitaria causada no homem pelo acumulo da microfilária Onchocerca volvulus (Leuckart, 1893). Esta filaria tem como uma de suas características depende de simulideos para a sua transmissão.
- O parasita fêmea mede 30 a 50 cm de comprimento, por 03 a 0,4 mm de diâmetro, sendo que o macho alcança entre 2 a 4 cm de comprimento por 0,1 a 0,2 mm de diâmetro. A oncocercose está presente em 26 países na África, seis nas Américas (central e do sul) e um na Ásia. Nas Américas, de acordo com a Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), aproximadamente 5,25 milhões de indivíduos estão nas áreas de risco, com mais de 97.000 infectados (WHO,1991).
- Beazoti et al.(1967) relatam o primeiro caso de oncocercose adquirida no Brasil, em uma criança, filho de missionários estrangeiros, procedentes de Roraima, que tinham vivido entre os índios Yanomami.
- Moraes & Dias (1972), Moraes et. al. (1974) e trabalhos subseqüentes, evidenciaram a forma endêmica da oncocercose na área geográfica em que viviam os grupos indígenas Yanomami e Ye´kuana.
- As atenções sobre o foco Yanomami/Ye´kuana mudaram quando Gerais & Ribeiro (1986) relataram o primeiro caso autóctone de oncocercose fora da área indígena, em Minaçú, Estado de Goiás, cidade com grande número de garimpeiros que tinham saído de Roraima, provindos em sua maioria da Serra do Surucucu, área Yanomami. A paciente nunca esteve na área indígena Yanomami/Ye´kuana e possivelmente adquiriu a doença nessa região que compreende o alto curso do rio Tocantins.
- Segundo Py-Daniel (1989 e 1994a), a dispersão da oncocercose no Brasil, estava ocorrendo tanto pelos missionários, como por funcionários da FUNAI, com diferentes etnias indígenas, além dos garimpeiros, que já era conhecida. Também alertou para, que os membros do Exército Brasileiro, por já estarem se fixando na Terra indígena Yanomami/Ye´kuana através dos pelotões de fronteira (PEFs), tanto no Estado de Roraima como do Amazonas, possivelmente estariam envolvidos como futuros dispersores da Onchocerca volvulus, caso não fosse, tomadas as devidas providencias relacionadas tanto a exames periódicos, como quanto aos deslocamentos dos assentados nos PEFs para outras unidades do EB na Amazônia ou fora dela.
- No final de 1989 foi efetivada a retirada de grande quantidade de garimpeiros as área indígena Yanomami/Ye´kuana, através de uma atividade conjunta entre Forças Armadas, Polícia Federal e FUNAI. Não existem informações reais quanto a quantidade de garimpeiros retirados, mas indicações que os números foram acima de 20.000 indivíduos. Mesmo sendo as autoridades responsáveis alertadas para a necessidade de serem feitos exames parasitológicos para se diagnosticar a presença de O. volvulus em todos os garimpeiros retirados da área, os mesmos não foram feitos. A maior parte dos garimpeiros retirados estava trabalhando em áreas meso e hiperendêmicas para oncocercose. Este número elevado de garimpeiros está/esteve amplamente espalhado, em sua maior parte, em outras áreas de garimpo de todo o Brasil (Pará, mato Grosso, Rondônia, Goiás, Tocantins), além de outras áreas nos Estados do Amazonas e Roraima.
- A distribuição e transmissão da oncocercose estão determinadas por vários fatores que envolvem tanto o parasito quanto ao vetor-simulídeo, influenciando portanto, o graus de severidade da oncocercose nas Américas (OMS, 1966; Duke, 1970; Shelley et al., 1987b; Basanez et al., 1994).
- Entre os fatores que influenciam na transmissão da oncocercose podem ser citados (Narbaiza, 1987): presença das espécies vetoras para O. volvulus; abundância de criadouros; grau de antropofilia; densidade de picadas (número de picadas homem/tempo); abundância de indivíduos de O. volvulus e densidade de microfilárias na pele do paciente; densidade da população humana exposta ao risco da infecção; número de microfilárias vivas que o inseto é capaz de tolerar sem sua capacidade de sobrevivência ser afetada; número de microfilárias vivas que o inseto ingere a cada repasto sangüíneo; a capacidade do vetor de infectar o hospedeiro definitivo; fatores climáticos que podem influenciar na dinâmica populacional dos vetores.
- As medidas de prevalência e intensidade de infecção em uma população humana, variam de acordo com as características demográficas da área, tais como: idade e sexo dos habitantes; diferenças entre as comunidades; mudanças nas taxas de infecção-comparadas à avaliações anteriores; causas de aumento e declínio na prevalência da infecção e outros fatores dependentes das peculiaridades locais (Kirkwood et al., 1983).
Mazzoti
(1951) constatou no México, após observações baseadas em biópsias que as
microfilárias tinham uma tendência a se distribuírem irregularmente em toda a
pele da metade superior do corpo à cintura pélvica do ser humano (hospedeiro
definitivo), raramente nas extremidades baixas, sendo as larvas encontradas nos
ombros, uma das melhores áreas para se fazer a biópsia. Estas informações de
Mazzoti, quanto a tendência de encontrar mais filarias nas partes superiores do
corpo, pode estar associada com a atividade topológica do tipo de vetor, que no
México, a principal espécie vetora, pica mais nas partes superiores, pois em
outros lugares onde existem espécies que preferem áreas inferiores para picada,
o encontro de filarias é topologicamente outro.
PROGRAMA DE CONTROLE DA ONCOCERCOSE NO BRASIL
A Terra Indígena Yanomami (e
Ye´kuana) compreende, no Brasil, a região montanhosa do Escudo das Guianas,
divisor de águas entre as bacias do rio Orinoco (Venezuela) e do rio Amazonas
(Brasil). Os Yanomami e Ye´kuana vivem em aproximadamente 188 comunidades,
distribuídas em 27 pólos-base de saúde (25 pólos Yanomami, 1 pólo
Yanomami-Ye´kuana e 1 pólo Ye´kuana) em uma área contínua de 9.400.00 há.
(Py-Daniel, 1997).
Segundo Py-Daniel (1997), no
censo de agosto de 1995 (FNS/DSY-RR), o número de indivíduos para a etnia
Yanomami, no Brasil, foi de 9.384 indivíduos (26 pólos-base), sendo que 3.654
(38%) indivíduos (9 pólos-base) estavam no estado do Amazonas e 5.820 (62%)
indivíduos (17 pólos-base) estavam no
Estado de Roraima. A área Yanomami no Estado de Roraima é mais extensa do que
no Estado do Amazonas. Estes 26 Pólos-base eram assistidos por entidades
governamentais (FUNAI, FNS) e não governamentais (MEVA, CCPY, Salesianos,
Diocese, Missões, etc...).
Desde que a oncocercose foi
detectada entre os Yanomami/Ye´kuana, esta área recebeu equipes de investigação
clínico-dermatológicas para avaliação da situação epidemiológica da mesma.
Dentro desses planejamentos está o Programa de Eliminação da Oncocercose do
Brasil, que realizou entre 1993 e 1995, nos chamados Pólos-base, os
levantamentos primários pré-tratamento, nas áreas de conhecimento de
Entomologia, Parasitologia e Oftalmologia (Py-Daniel, 1997).
A população Ye´kuana censada no
Brasil, em agosto de 1995 (FNS) era de 257 indivíduos distribuídos em dois
Pólos-base (Auaris com 200 indivíduos e Waikás com 57 indivíduos), todos localizados no Estado de
Roraima.
Dentro do Programa Brasileiro de
Controle da Oncocercose, foram desenvolvidos trabalhos mais extensos com
vetores da filaria O. volvulus, na área Yanomami/Ye´kuana, por Medeiros &
Py-Daniel (1999), Andreazze & Py-Daniel (1999), onde estudaram a
transmissão dessa filária durante o período de um ano no Pólo-base Xitei/Xidea,
no Estado de Roraima.
EPIDEMIOLOGIA
Segundo Davies & Crosskey
(1991), a oncocercose é uma doença razoavelmente conhecida, sendo que as
espécies de simulideos envolvidas na transmissão variam de lugar para lugar, e
a área total de distribuição geográfica destas espécies são freqüentemente
maiores do que as áreas em que elas atuam como vetoras da filaria O.
volvulus.
O estudo da epidemiologia da
oncocercose, em qualquer região, envolve variáveis como densidade demográfica,
densidade do vetor, prevalência dos infectados, características biológicas do
vetor (capacidade de ingestão de microfilária, longevidade, etc...), estrutura
etária da população, localização dos criadouros de simulideos, fatores sociais
que interferem no contato homem-vetor (costumes de uma comunidade). Deve-se
considerar também o número de fêmeas de simulideos picando em uma população em
um dado período de tempo, em função da estação do ano, pluviometria,
temperatura, umidade e vegetação (Cordero-Moreno, 1973).
As diferenciações das áreas em
relação aos níveis de endemicidade (quanto as prevalências) são classificadas
segundo uma convenção do Programa de Eliminação da Oncocercose para as Américas
(OEPA) como: (0%) – área não endêmica; (1-20%) – área hipoendêmica; (21-59%) –
área mesoendêmica; (acima de 60%) – área hiperendêmica.
MANSONELOSE
A mansonelose é causada pela Mansonella
ozzardi, uma filaria autóctone das Américas. No Brasil, até o presente,
apenas os simulídeos foram assinalados como vetores, ao contrário de outros
países onde os ceratopogonideos também transmitem (Medeiros & Py-Daniel, 2009).
Ainda não existe um Programa de Controle da Mansonelose para o Brasil.
OBJETIVO
O objetivo deste trabalho foi determinar a infecção natural
por O.
volvulus (Leuckart, 1893) das três espécies antropófilas coletadas em
oito localidades da Terra Indígena Yanomami (Ye´kuana), bem como obter a Taxa
de infecção Parasitária (TIP) nas referidas áreas, por meio experimentos
completos de um dia de captura (12 horas).
O mesmo foi feito para M. ozzardi (Manson, 1897) encontrada
na localidade Apuí (rio Marauiá), Estado do Amazonas.
MATERIAL E MÉTODOS
O
estudo foi desenvolvido através com base na análise do material coletado em
oito localidades na Terra Indígena Yanomami (Ye´kuana), sendo três delas no
Estado do Amazonas (Ajuricaba, Apuí e Pukina) e cinco no Estado de Roraima
(Alto Mucajaí (Missâo Mucajaí), baixo Mucajai, Paapiú, Palimiú e Waikás)
(Tabela 1).
Nestas oito localidades foram assinaladas três espécies, Cerqueirellum
oyapockense (Floch & Abonnenc, 1946), Psaroniocompsa incrustata
(Lutz, 1910) e Thyrsopelma guianense (Wise, 1911).
A classificação quanto ao nível de endemicidade foi feita
com base em biópsias em uma fração da população presente nas áreas estudadas
(Py-Daniel, 1997).
As coletas foram realizadas em um (1) dia para cada área
estudada (Tabela 2), com um colaborador Yanomami. As atividades foram iniciadas
as 06:00 horas e finalizadas as 18:15 horas, alternando 15 minutos de coleta
por 15 minutos de descanso.
Os simulideos foram
capturados com auxilio de 4 coletores de sucção (sendo um para cada região do
corpo, assim determinado: TP = Tórax-Pescoço, BM = Braço-Mão, CX = Coxa, PP =
Perna-Pé). Eram capturados assim que pousavam sobre o colaborador.
Entre os intervalos de uma coleta e outra era feita a
análise dos ovários (paridade). As fêmeas eram anestesiadas com vapor de
clorofórmio e em seguida retiradas dos tubos coletores, sendo levadas ao
microscópio estereoscópico e colocadas sobre lâminas escavadas com uma gota de
soro fisiológico, onde as espécies eram identificadas e em seguida determinado
o estado fisiológico (nulíparas ou paríparas), puxando-se os últimos segmentos
abdominais com ajuda de estiletes (Kamm & Ritcher, 1972). As fêmeas
nuliparas, são virgens que ainda não produziram ovos, as paríparas já
realizaram repasto sangüíneo anterior e já produziram ovos (Detinova, 1968).
Após a análise do estado fisiológico, os simulideos eram colocados em tubos de
ensaio com álcool 70%, sendo etiquetados (data, local, hora, estado
fisiológico, topologia de picada) para estudos posteriores em laboratório.
No laboratório era retirado todo o álcool contido no tubo de
ensaio, onde encontravam-se as fêmeas coletadas, com ajuda de uma pipeta, sendo
as fêmeas lavadas posteriormente, com agia destilada, para retirar o excesso de
álcool, em seguida, retirava-se a água destilada e era adicionada a
hematoxilina ácida para a coloração por período de 48 horas. Este método visa
não só a coloração dos músculos dos simulideos, como também a colocação das
filarias (Nelson, 1958). Passando este período, retirava-se a hematoxilina com
ajuda de uma pipeta e sendo lavados novamente com água destilada, sendo
posteriormente retirada a água e estando os exemplares prontos para dissecção e
preparo das lâminas.
As dissecções foram feitas utilizando-se estiletes finos,
onde os simulideos foram divididos em três partes (cabeça, tórax e abdômen)
colocadas sobre três pequenas gotas de glicerina (uma parte do exemplar para
cada gota) sobre uma lâmina para a retirada das cutículas, deixando-se apenas
os músculos e partes internas, sendo em seguidas postas as lamínulas. A lâmina
estava pronta para leitura e identificação da presença de filarias e seus
estádios (Davies & Crosskey, 1991).
A leitura das laminas foi feita sob microscópio óptico, onde
se constatava se as fêmeas estavam ou não infectadas por microfilárias. A
identificação das fases de tanto da O. volvulus como da M.
ozzardi (MF, L1, L2, L3) foi feita
segundo Ramirez-Perez (1977). Após a avaliação da lâmina, os dados referentes à
presença ou não de O. volvulus / M.ozzardi, eram anotados os resultados
em planilha.
Após a identificação dos estádios larvais (MF, L1,
L2, L3), era obtida, para cada localidade estudada, a
Taxa de Infecção Parasitária (TIP). A TIP era obtida a partir das seguintes
fórmulas:
RESULTADOS
DENSIDADE DE PICADAS
A densidade de picadas das fêmeas de simulideos, foi
observada durante os oito dias de coletas, totalizando 11.074 fêmeas capturadas
na somatória dos resultados das oito localidades estudadas. Densidade de picada
é definida como sendo o número fêmeas capturadas em atividade de picada por
unidade de tempo (Narbaiza, 1987).
Em Waikás, a espécie C. oyapockense, mostrou atividade de picada durante todo o dia, com maior pico no horário de 13:30h. A menor atividade de picada foram nos período de 06:00h e 18:15h. A outra espécie coletada nesta localidade foi T. guianense, onde apenas foi coletado um exemplar no período matutino das 06:30h.
Figura 2. – Atividade de picada de C.
oyapockense na localidade de Waikás, TIY, Roraima-Brasil (08/03/1994).
Em Paapiú (Maloca Paapiú) foram coletadas duas
espécies picando, C. oyapockense e P. incrustata. A espécie C.
oyapockense foi a mais abundante, demonstrando maiores picos de
atividade hematofágica nos horários de 08:00h e 12:00h. A menor atividade
hematofágica foi nos horários de 06:00h, 14:00h e 18:00h. Já a espécie P.
incrustata apresentou maior atividade de picada nos horários de 08:00h,
11:30h e 12:30h, e menor atividade de picada nos horários de 06:00h, 07:00h,
09:00h, 10:00h, 11:00h, 12:00, 13:00-18:00h. (Figura 3.)
Figura 3. – Atividade de picada das espécies C.
oyapockense e P. incrustata na localidade Maloca
Paapiú, TIY-Roraima-Brasil (28/04/1994).
Figura 4. – Atividade de picada da espécie C.
oyapockense na localidade Baixo Mucajai, TIY-Roraima-Brasil
(30/04/1994).
No Alto Mucajai (Missão Mucajai) foram coletadas duas
espécies, C. oyapockense e P. incrustata. A espécie C.
oyapockense foi a mais abundante nos dois turnos, com maior pico de
atividade no período das 15:30h, e a menor atividade de picada nos períodos de
06:00h e 18:15h. A espécie P. incrustata foi coletada nos
períodos de 07:00h, 08:00h, 14:30h e 17:00h (Figura 5.).
Em Ajuricaba foi coletada somente a espécie C. oyapockense que apresentou atividade de picada durante todo o dia, com maiores picos nos horários das 12:30h e 17:00h, e a menor atividade de picada no período das 18:00h. (Figura 6.).
Em Apuí (rio Marauiá) foi coletada somente a espécie C. oyapockense, que apresentou hematofagia durante todo o dia, com maiores picos de atividade nos horários de 10:00h, 13:00h e 14:00h, e a menor atividade de picada nos períodos de 06:00h e 18:00h. (Figura 7.).
Em Pukina (rio Marauiá), foi coletada somente a espécie C.
oyapockense que apresentou atividade de picada durante todo o dia, com
o maior pico no horário das 13:30, e a menor atividade de picada nos períodos
das 06:00h e 18:00h. (Figura 8.).
Em Palimiú foi coletada somente a espécie C. oyapockense exercendo atividade de picada durante todo o dia, com maiores picos de atividade nos horários das 12:00h e 14:00h, e a menor atividade nos períodos das 06:00h e 18:00h. (Figura 9.)
TOPOLOGIA CORPÓREA
Tabela 4. – Distribuição e percentual de indivíduos
coletados segundo a topologia corpórea para as três espécies vetoras em todas
as oito áreas estudadas.
Figura 11. – Número total de indivíduos coletados nas diferentes regiões do corpo para a espécie T. guianense.
Figura 12. – Número total de indivíduos coletados nas diferentes regiões do corpo para a espécie P. incrustata.
WAIKÁS
Ocorreram duas espécies, C. oyapockense, que
apresentou preferência corpórea pelas partes altas do corpo (Tórax-Pescoço =
1.109 exemplares; Perna-Pé = 607 exemplares; Braço-Mão = 400 exemplares; e Coxa
= 138 exemplares); e T. guianense representada por apenas
um (1) exemplar capturado na região Tórax-Pescoço (Figura 13.).
PAAPIÚ (MALOCA PAAPIÚ)
BAIXO MUCAJAÍ
ALTO MUCAJAÍ (MISSÃO MUCAJAÍ)
AJURICABA
APUÍ
PALIMIÚ
Ocorreu apenas C. oyapockense apresentando
preferência pelas partes altas do corpo (Tórax-Pescoço = 1.323 exemplares;
Perna-Pé = 1.046 exemplares; Braço-Mão = 328 exemplares; e Coxa = 303
exemplares) (Figura 19.).
PUKIMA
Figura 20. - Número de indivíduos coletados nas
diferentes partes do corpo, na localidade Pukina - Amazonas (30/11/1995).
ESTADO DE
DESENVOLVIMENTO OVARIANO
Do total de 11.074 exemplares coletados, nas oito
localidades examinadas, 8.511 exemplares (76%) eram paríparas e 2.563
exemplares (23,1%) nulíparas (Tabela 5.)
Tabela 5. – Total de fêmeas coletadas, nas oito áreas,
em relação ao estado fisiológico ovariano (paríparas/nulíparas) das três
espécies de simulídeos.
WAIKÁS
A
espécie C. oyapockense apresentou 2.254 exemplares coletados, sendo 2.050
exemplares (90,94%) pariparos e 204 exemplares (9,06%) nulíparos. T.
guianense apresentou 1 (100%) exemplar nulíparo (Figura 21.).
Figura 21. – Estado Fisiológico Ovariano dos
exemplares coletados na localidade Waikás – Roraima – Brasil (08/03/1994).
PAAPIÚ (MALOCA PAAPIÚ)
A
espécie C. oyapockense apresentou 472 exemplares coletados, sendo 329
exemplares (67,3%) paríparos e 143 (29,2%) nulíparos. Já P. incrustata apresentou
17 exemplares, sendo 13 (76,47%) paríparos e 4 (23,53%) nulíparos (Figura 22.).
Figura 22. – Estado Fisiológico Ovariano dos
exemplares coletados na localidade Paapiú (Maloca Paapiú) – Roraima – Brasil
(28/04/1994).
BAIXO MUCAJAÍ
A
espécie C. oyapockense apresentou exemplares 680 exemplares coletados, sendo 488
(71,7%) paríparos e 192 (28,3%) nulíparos (Figura 23.).
Figura 23. – Estado Fisiológico Ovariano dos
exemplares coletados na localidade Baixo Mucajaí – Roraima – Brasil
(30/04/1994).
ALTO MUCAJAÍ (MISSÃO MUCAJAÍ)
A
espécie C. oyapockense apresentou 1.098 exemplares coletados, sendo 944
(85,6%) paríparos e 154 (13,9%) nulíparos. Já T. guianense apresentou 5
exemplares, sendo 3 (60%) paríparos e 2 (40%) nulíparos (Figura 24.).
Figura 24. – Estado Fisiológico Ovariano dos
exemplares coletados na localidade Alto Mucajaí (Missão Mucajaí) – Roraima – Brasil (02/05/1994).
AJURICABA
A
espécie C. oyapockense apresentou 1.441 exemplares coletados, sendo 962
(66,7%) paríparos e 479 (33,3%) nulíparos (Figura 25.).
Figura 25. – Estado Fisiológico Ovariano dos
exemplares coletados na localidade Ajuricaba – Amazonas – Brasil (22/11/1994).
APUÍ (MARAUIÁ)
A
espécie C. oyapockense 2.056 exemplares coletados, sendo 1.336 (65%)
paríparos e 720 (35%) nulíparos (Figura 26.).
PALIMIÚ
A
espécie C. oyapockense apresentou 3.000 exemplares coletados, sendo
2.358 (78%) paríparos e 642 (21,4%) nulíparos (Figura 27.).
Figura 27. – Estado Fisiológico Ovariano dos
exemplares coletados na localidade Palimiú – Roraima – Brasil (22/05/1995).
PUKIMA (MARAUIÁ)
A
espécie C. oyapockense apresentou 50 exemplares coletados, sendo 27
(54%) paríparos e 23 (46%) nulíparos (Figura 28.).
Figura 28. – Estado Fisiológico Ovariano dos
exemplares coletados na localidade Pukina (Marauiá) – Amazonas – Brasil
(30/11/1995).
INFECÇÃO NATURAL
Dos oito locais coletados, foram examinados para infecção
natural apenas seis [Apui, Pukima, Alto Mucajai (Missão Mucajaí), Baixo
Mucajai, Paapiú e Palimiú]. Dos seis locais, quatro apresentaram simulideos com
positividade para O. volvulus (203 exemplares) e um para M. ozzardi (37
exemplares). Todas os exemplares positivos eram da espécie C. oyapockense. As Taxas de Infecção Parasitária (TIP) para
os locais examinados estão apresentadas na Tabela 6. Foram encontradas larvas
de O.
volvulus e M. ozzardi em todos os estádios (microfilária, L1, L2,
L3). O maior número de fêmeas infectadas foi coletado picando na
região do Tórax-Pescoço e o menor número na Coxa. A forma evolutiva mais
abundante foi L1.
Tabela 6. – Taxa de infecção Parasitária (TIP) das
cinco localidades examinadas na Terra Indígena Yanomami (Ye´kuana), quatro para
oncocercose e uma para (M) = Mansonella ozzardi.
DISCUSSÃO
DENSIDADE DE PICADA / DISTRIBUIÇÃO DIÁRIA
Dentro das coletas examinadas, a maior densidade de picada
foi de C. oyapockense com 11.051 exemplares (99,8%), seguida P.
incrustata 17 exemplares (0,15%) e T. guianense seis exemplares
(0,05%). A espécie C. oyapockense foi a única coletada em todas as localidades.
Shelley (1988b), também na área Yanomami (Ye´kuana), obteve
resultados semelhantes com a espécie C. oyapockense, onde observou uma
maior densidade de picada desta espécie no período chuvoso. Segundo Py-Daniel
& Rapp Py-Daniel (1998), a densidade de picada, sobre o ser humano, também
está relacionada com a proximidade dos criadouros dos simulideos (os principais
substratos para suas formas imaturas, normalmente, são não-aquáticas
encontradas pendentes nas margens e/ou caídas no leito dos cursos d´água de
médio e grande volume). Os mesmos autores relatam que em, época de cheia (de
março a setembro, com picos de chuva entre maio e julho), há uma maior
disponibilidade de substratos (folhas, galhos, etc.), favorecendo o
desenvolvimento de imaturos (larvas/pupas) da espécie C. oyapockense, ocorrendo
um aumento assim um aumento no número de adultos (fêmeas) picando.
Shelley et al.
(1987) e Shelley et al. (1988)
afirmaram que C. oyapockense é o vetor mais importante da oncocercose nas
áreas de terras baixas, no Brasil e Venezuela, onde a espécie é
predominantemente antropófila. Py-Daniel (1997), ratifica que C.
oyapockense é uma das principais espécies envolvidas na transmissão de O.
volvulus, tanto pela abundância como pela ampla distribuição
geográfica.
Medeiros & Py-Daniel (1999), na área Yanomami, no
Pólo-base de Xitei/Xidea, obtiveram resultados semelhantes com C.
oyapockense, salientando a associação com o período de maior
precipitação pluvial.
Neste trabalho, a atividade hematofáfica de C.
oyapockense ocorreu durante todo o dia, com tendência de maior
atividade no período da tarde, nas localidades de Waikás (Figura...), Alto
Mucajaí (Missão Mucajai) (Figura...), Ajuricaba (Figura...), Pukima (Figura
...) e Palimiú (Figura...). O mesmo foi constado por Shelley (1988a, 1988b) e
Medeiros & Py-Daniel (1999). Provavelmente algum fator climatológico possa
influencia neste tipo de atividade hematofágica.
T. guianense esteve presente como a segunda espécie, em
localidades coletadas (02 / 08 áreas), sendo a terceira em número total de
indivíduos coletados (06 / 11.074 exemplares) (Tabela 03). Esta baixa densidade
de indivíduos nitidamente está relacionada ao período climático no qual foram
feitas a maior parte das coletas (Py-Daniel et
al., 1999), período chuvoso, onde o substrato preferencial para os imaturos
desta espécie, plantas da família Podostemaceae, não estão disponíveis, o que
causa uma diminuição no número de fêmeas picando (Py-Daniel, 1994b).
Shelley (1988b) diz que a atividade de picada de T.
guianense é variável, sendo que os graus de atividade de picada flutuam
sazonalmente nas áreas montanhosas do foco de oncocercose, com um maior número
de fêmeas picando (200 exemplares / pessoa dia) ocorrendo mais na estação seca
do que na estação chuvosa (01 exemplar / pessoa dia), sendo que a atividade de
picada ao longo do dia podendo apresentar ciclos variados, dependendo da
localidade e estação sazonal.
As coletas dos simulídeos foram realizadas nos meses de
março, abril e maio (período chuvoso) e novembro (período de seca) (Tabela
02.).
Nas áreas estudadas, no Estado do Amazonas, as coletas não
evidenciaram T. guianense no período da seca (25.11.1994 – Ajuricaba,
27.11.1994 – Apuí, 30.11.1995 – Pukina), mas sim C. oyapockense.
Py-Daniel et al.
(1999) observaram que as populações de imaturos de T. guianense podem
apresentar capacidade de adaptação para substratos opcionais (como diretamente
nas rochas e vegetações não aquáticas caídas nos cursos d´água), caso os
substratos preferenciais (Podostemaceae) não estejam disponíveis (por
transformações ambientais naturais ou antropogênicas).
O pequeno número (06 exemplares) de T. guianense coletado não
permite maiores análises, no entanto, quatro (66,7%) foram coletados no período
da manhã (06:30h, 07:00h e 08:00h) e dois (33,33%) no período da tarde (14:00h,
17:00h). Estes resultados concordam com Py-Daniel et al. (1999), que verificaram na região da Cachoeira 40 Ilhas, rio
Pitinga, Municipio de Presidente Figueiredo, Estado do Amazonas, que T.
guianense demonstrou um padrão bimodal de picada, com maior atividade
no período da manhã (06:00h às 09:00h) e no período da tarde (14:00h às
18:15h). Também concordam com esta atividade bimodal, para esta espécie, os
estudos de Lacey & Charlwood (1980), Lacey (1981), Narbaiza (1987) e Shelley
et al. (1997).
Quanto a P. incrustata, esteve presente como
a terceira em número de localidades (01 / 08 áreas) e como segunda em número de
indivíduos coletados ( 17 / 11.074 exemplares), ocorrendo em Paapiú (Maloca
Paapiú) no mês de abril (período chuvoso).
Narbaiza (1987), trabalhando na Venezuela, na área indígena
Yanomami, na localidade denominada Parima-B, em quatro coletas (março, agosto,
setembro e fevereiro) obteve um maior número de indivíduos exercendo atividade
de picada no mês de fevereiro (inicio da época de maior precipitação
pluviométrica.
Andreazze & Py-Daniel (1999), coletando na Terra
Indígena Yanomami (Ye´kuana), no Brasil, na localidade Watatas, não muito
distante da área trabalhada por Narbaiza (1987), verificaram a menor ocorrência
no mês de janeiro, período de seca, e maior em junho, período chuvoso. Os
mesmos autores afirmaram que a população de P. incrustata fica regulada
pelo regime de chuvas da região, aumentando o número das formas imaturas e
adultos no período chuvoso. No período de seca ocorre uma redução significativa
na disponibilidade de substratos (plantas marginais aos cursos d´água que ficam
em contato com a água).
TOPOLOGIA CORPÓREA
A espécie C. oyapockense apresentou maior
atividade de picada nas partes altas do corpo (Tórax-Pescoço), seguida das
regiões Perna-Pé, Braço-Mão e Coxa (Figura...).
Shelley (1988a, 1988b),
Medeiros & Py-Daniel (1999) obtiveram resultados semelhantes, quando
verificaram que esta espécie pica em todas as áreas do corpo, como maior
preferência pelas áreas acima da cintura, particularmente Tórax-Pescoço.
Resultado contrário foi observado na localidade de Pukima (rio Marauiá), onde
esta espécie apresentou preferência em picar nas partes baixas do corpo
(Figura 20.).
Mesmo com número reduzido (06) de exemplares coletados, T.
guianense, também demonstrou uma maior preferência de picada pela
região Tórax-Pescoço, seguida pela região Braço-Mão (Figura 11.).
Resultados
diferentes foram obtidos por Lacey & Charlwood (1980), Lacey (1981),
Shelley (1988a), Shelley et al.
(1997), que relataram a preferência topológica pelas partes baixas do corpo
humano, mais especificamente Perna-Pé e Coxa. Em Py-Daniel (MS/FNS-1995) e
Py-Daniel (1997), com base em experimentos realizados em duas localidades
Yanomami do alto rio Demini, Estado do Amazonas [Toototobi (07-10.09.1995) e
Balawa-ú (15.09.1995), é evidenciada a nítida preferência pelas regiões Perna-Pé
(Toototobi = 71,4%; Balawa-ú = 54%).
Em relação a P. incrustata, a mesma apresentou
preferência tópica pelas partes Perna-Pé (Figura 12.).
Takaoka et al. (1995), com material proveniente
das localidades Parima-B e Coyoweteri obtiveram resultados contrários para esta
espécie, que apresentou nítida preferência pela metade superior do corpo (71,4%
= Parima-B, 65% = Coyoweteri). Py-Daniel (MS/FNS-1995) referindo-se ao “RENTA”
(Avaliação Entomológica Rápida - desenvolvida em Balawa-ú (Estado do Amazonas)
entre 12-15.09.1995 cita que P. incrustata apresentou a área
Tórax-Pescoço como preferencial a picada (71,4%). Andreazze & Py-Daniel
(1999) obtiveram resultados no Pólo-Base Xitei/Xidea (Roraima), com preferência
desta espécie na região Tórax-Pescoço, seguido da região da Coxa.
As causas destas preferências, tanto corpórea como por
diferentes ambientes, ainda não estão devidamente esclarecidas. Os mecanismos
que comandam essa interação são ainda desconhecidos, surgindo hipóteses com a
partir de especificidades dos locais e/ou associações às condições de cada
região.
Entende-se que em uma área onde haja insetos com hábitos
hematófagos, como as fêmeas de simulideos, as partes expostas do corpo é que
serão os alvos procurados. Porém, em se tratando das populações indígenas
Yanomami, nota-se que certas partes do corpo são mais atingidas que outras,
mesmo que o hábito de andar nu seja o normal, ou seja, os insetos tendo todo o
corpo exposto para praticar picadas, eles preferem algumas prioritariamente.
ESTADO DE DESENVOLVIMENTO DOS OVÁRIOS
As três espécies estudadas apresentaram maior abundancia de
fêmeas paríparas do que nulíparas. C. oyapockense apresentou 76,9% de
fêmeas paríparas; P. incrustata (mesmo com pequeno número capturado, apresentou
76,5% de fêmeas paríparas; T. guianense (com menor número
ainda, apresentou 66,7% de fêmeas paríparas (Tabela 05.).
Medeiros & Py-Daniel (1999), no Pólo-Base Xitei/Xidea,
verificaram que 84% das fêmeas de C. oyapockense eram paríparas.
Segundo estes autores, C. oyapockense possui um elevado
grau de antropofilia e pode realizar seu ciclo gonadotrófico na área estudada
(Xitei/Xidea) em um tempo uniforme, devido os criadouros estarem presentes nas
margens do rio Parima, onde as fêmeas realizam a oviposição. A distancia destes
criadouros e a área de repasto sangüineo das fêmeas é relativamente próxima
(500 metros), o que permite que logo após a oviposição, as fêmeas já possam
estar disponíveis para novo ciclo alimentar.
Andreazze & Py-Daniel (1999) trabalhando com P.incrustata, no mesmo Pólo-Base de
Xitei/Xidea coletaram 59,1% das fêmeas pariparas.
Py-Daniel et al.,
em trabalho realizado no rio Pitinga, Estado do Amazonas, verificaram o maior
número de fêmeas de T.guianense coletado foi de pariparas (54,1%), não existindo
diferença estatisticamente significativa (P < 0,05) no número coletado entre
os períodos manhã/tarde. Já as nulíparas, apresentaram maior atividade no
período da manhã.
INFECÇÃO NATURAL
Cinco localidades
apresentaram positividade para filarias [quatro (com o total de 203 exemplares
positivos) para O. volvulus: Baixo Mucajai (TIP pariparas+nuliparas = 0,74%,
TIP paríparas = 1,02%), Maloca Paapiú (TIP pariparas+nuliparas = 1,64%, TIP
paríparas = 2,34%), Alto Mucajaí (TIP pariparas+nuliparas = 4,17%, TIP
paríparas = 4,86%), Palimiú (TIP pariparas+nuliparas = 4,63%, TIP paríparas =
5,89%); e uma (com o total de 37 exemplares positivos) para M.
ozzardi: Apuí (TIP pariparas+nuliparas = 1,80%, TIP paríparas =
2,77%)], sendo que as maiores TIP para O. volvulus foram obtidas em
Palimiú, com 144 fêmeas positivas de um total de 2.358 femeas paríparas
coletadas (Tabela 06.).
O fato de ter sido encontrada apenas a espécie C.
oyapockense com exemplares positivos tanto para O. volvulus como para M.
ozzardi pode estar relacionado
com a grande quantidade de exemplares coletados na época amostradas, em
comparação a T. guianense e P. incrustata. Época de maior
disponibilidade dos substratos que favorecem os imaturos de C.
oyapockense. (Py-Daniel, 1994b).
Shelley (1994) propõem que as espécies de simulídeos,
envolvidos na transmissão de filarias, na América Latina podem ser divididas em
dois grupos de acordo com a presença ou ausência de dentes no cibário. Entre as
espécies que possuem cibários com dentes inclui-se C. oyapockense e P.
incrustata, onde menos de 2% das microfilárias engorgitadas desenvolvem
o estádio infectivo (L3), por causa dos danos ocasionados pelos
dentes do cibário, enquanto que as espécies que não possuem dentes no cibário,
como T.
guianense, mais de 60%dos indivíduos desenvolvem a forma L3.
Pensamos que aqui (na comparação entre C. oyapockense / P.
incrustata com T. guianense) também deva ser levado
em consideração o tamanho dos exemplares. T. guianense é uma espécie que
apresenta tamanho nitidamente MAIOR que C. oypockense e P. incrustata, o que
pode influenciar também na capacidade de albergar maior número de filarias.
Py-Daniel (1994a) através de coletas em 10 Pólos-base na
Terra Indígena Yanomami (Ye´kuana), localizados nos Estados do Amazonas e
Roraima, constatou que foram coletados proporcionalmente 1:3 individuos das
espécies T. guianense : C. oypockense, mas que ambas
apresentaram uma taxa de infecção natural para O. volvulus relativamente
semelhante (5,54% - T. guianense / 5,34% - C. oyapockense). Segundo o mesmo
autor, este resultado refuta, ao nível epidemiológico, a proposta da
importância prioritária do cibário sem dentes, pois um maior número de
indivíduos picando (de uma espécie com cibário denteado) pode apresentar uma
mesma efetividade total de transmissão.
Medeiros (1997), em estudos realizados no Pólo-Base
Xitei/Xideia – Roraima, verificou que de três espécies (C. oyapockense, N.
exiguua e E. bipunctata), apenas as duas primeiras espécies
apresentaram-se positivas para O. volvulus, com uma Taxa de
Infecção Parasitária (TIP) total de 2,5%. Os indivíduos de C. oyapockense tanto
foram mais abundantes como apresentaram uma maior número de fêmeas paríparas
coletadas, e apenas três fêmeas apresentaram positividade para O.
volvulusi, com uma TIP de 2%.
Segundo Py-Daniel (1997), dependendo do do ponto inicial ao
qual analisamos a relação dos vetores com a TIP, poderemos ter interpretações
diferentes:
- A dinâmica dos vetores está diretamente relacionada com as macro-mudanças climático-sazonais;
- O exame quanto a distribuição geográfica dos vetores é relativo, pois teríamos que coletar em todos os lugares durante o período de um ano, o que não foi feito neste trabalho, portanto uma análise puramente deste fator pode levar a erros de interpretação;
- As coletas anuais suportariam a presença/ausência de um determinado vetor, em uma determinada área e, como as coletas são feitas com base em um único experimento padrão, em áreas regidas por diferentes parâmetros (tanto ao nível de localização ao longo dos cursos d´água, como de substratos disponíveis nos criadouros, como níveis topográficos, como número de pessoas presentes para servir de suporte alimentar para os vetores), os resultados podem não expressar internamente estas diferenças e representarem assim falsas realidades.
Portanto, o exame comparativo das TIPs, obtidas em
diferentes áreas, em diferentes épocas sazonais, pode incorrer em conclusões
não verdadeiras. A obtenção das Taxas de Infecção Parasitárias (TIP) dos
vetores, através de exames em coletas de apenas um dia, como foi realizado, não
necessariamente expressam realidades epidemiológicas comparáveis (tanto a
densidade de picada, como as espécies, podem ser diferentes dependendo dos
outros fatores, p.ex. ambientais, que não são levados em conta quando se
comparam puramente as TIPs).
CONCLUSÕES
A espécie Cerqueirellum oyapockense foi a mais
abundante, nos experimentos de coleta em atividade de picada, com atividade
durante todo o dia e em todos os horários, com tendência a maior atividade
hematofágica pela parte da tarde.
A alta densidade de indivíduos de C. oyapockense pode estar
relacionada a predominância das coletas terem sido feitas principalmente no
período de cheia, onde há maior disponibilidade de substrato apropriado para os
imaturos.
A maior preferência tópica para picada das espécies C.
oyapockense e T. guianense foram as partes altas
do corpo (Tórax-Pescoço). No Pukina (rio Marauiá) C. oyapockense apresentou
preferência em picar as partes baixas do corpo (Perna-Pé).
A espécie P. incrustata mostrou preferência em
picar as partes baixas do corpo (Perna-Pé).
Houve predomínio das fêmeas em estado fisiológico
reprodutivo paríparo nas atividades de picada.
Foram encontradas larvas de O. volvulus em todas as
parte dos simulídeos (cabeça, tórax e abdômen), sendo o maior número de larvas
presente na região do tórax.
A larva no estádio L1 de O. volvulus foi a mais
abundante.
Para se obter uma definição com maior precisão dos
relacionamentos vetor/seres humanos, ou seja, uma melhor caracterização
epidemiológica de uma determinada área, são necessários experimentos
sequenciais com duração mínima que consiga abranger todas as mudanças
(climáticas, migracionais, hídricas, vetor-comportamentais) nas regiões
estudadas.
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